sábado, 10 de janeiro de 2015

Estreia em Correntina o espetáculo “Auto das nascentes: a epopeia de um vale em-cerrado” com direção de Dominique Faislon

Zulmira Faislon (Foto por Robson Vieira)

Depois de 30 dias de intensa oficina de preparação de atores, sob a direção de Dominique Failson, o público de Correntina e visitantes vislumbram-se com um belíssimo espetáculo realizado em praça pública.
(Foto por Robson Vieira)
O curso de preparação de atores, parte do projeto "Em-cantos dos Gerais: Autos, Ternos e Reisados Teatrais", contemplado pela Funceb (Fundação Cultural do Estado da Bahia) através do Calendário das Artes 2/2014, chegou ao fim com a realização de um belíssimo espetáculo em praça pública.
Vanderleia Barbosa (Foto por Robson Vieira)
O dia 9 de janeiro de 2015 passa a ser lembrado como uma importante data para a história do teatro da pequena cidade de Correntina. A proposta de imersão no universo popular, utilizando do estudo do corpo dentro do reisado, resultou numa epopeia em que aborda temas que versam desde a preservação do cerrado até a importância dos ritos e manifestações religiosas que se firmam como parte da identidade cultural dessa região oeste da Bahia.
(Foto por Robson Vieira)
No palco 18 atores compuseram a montagem cênica que preencheu os olhos do público, estimado em mil pessoas, presente no pátio do Mercado Municipal de Correntina, que entre uma cena e outra se manifestavam por meio de risos, aplausos e profundas pausas reflexivas.
(Foto por Robson Vieira)
“Participar desse curso foi um processo de muito crescimento, amadurecimento é uma mistura de bons sentimentos. Contribuímos com o crescimento cultural do município onde atuo como educadora, chego ao final com a certeza do dever cumprido”, corrobora Zulmira Faislon, atriz participante da montagem.
(Foto por Robson Vieira)
“Tivemos somente 30 dias para curso, preparação de atores, criação de texto e composição do espetáculo, o que é um prazo consideravelmente curto, mas ao final fiquei feliz com o resultado. É muito bom receber essa energia do publico que respondeu positivamente com a proposta do espetáculo. Isso demonstra que compreenderam a proposta da montagem. Só tenho a agradecer a todos os parceiros e colaboradores”, avalia Dominique Faislon.
(Foto por Robson Vieira)
Quem não foi na estreia vai poder assistir, e quem foi poderá ver novamente, o espetáculo que segue em cartaz nesse sábado, 10/01, às 19h e domingo, 11/01, às 21h, em frente ao Mercado Municipal de Correntina.

Por Culturas Corrente

Correntina realiza Encontro de Ternos e Reisados

Ternos das Camponesas (Foto: Robson Vieira)
O dia 9 de janeiro foi de festa para o município de Correntina. Cidade e zona rural se encontraram num celebrativo encontro de ternos e reisados.
(Foto: Robson Vieira)
A Secretária de Cultura de Correntina, fechando as comemorações dos festejos natalinos, realizou na Praça do Fórum o Encontro de Ternos e Reisados, na ocasião se apresentaram: o Reisado de Lauzinha (Correntina sede), Reisado da Cabeceira Grande (Comunidade de Cabeceira Grande – Correntina), Reisado de Brejo dos Aflitos (Comunidade de Brejo dos Aflitos – Correntina), Reisado da Boa Vista (Comunidade Boa Vista – Correntina) e Reisado de Mundim de João de Adão (Correntina sede). Além dos reisados, os ternos foram um espetáculo a parte. Estiveram presentes: o Terno dos Camponeses e Terno do Arigó (ambos de Correntina).
Ternos das Camponesas (Foto: Robson Vieira)
“O reisado é uma manifestação forte nesse município, com esse evento proporcionamos não somente um espaço para apresentação, mas o intercâmbio entre diversos grupos, da sede e do interior, e também o contato com públicos distintos. O que aconteceu nessa praça foi uma prova de que a cultura do reisado é viva e pulsante em Correntina”, avaliou Ernane Moreira, coordenador de eventos da Secretária de Cultura de Correntina.
(Foto: Robson Vieira)
(Foto: Robson Vieira)
(Foto: Robson Vieira)
 Por Culturas Corrente

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

A prosa barranqueira de Osório Alves de Castro

Osório Alves de Castro
Acho que foi no início dos tempos que a Natureza celebrou um pacto com os homens de letras: ela os engendraria de quando em vez, desde que eles narrassem aos outros homens a terra em que haviam sido engendrados. Mais provável, talvez, que, longe de esperar pela volição dessa espécie tão inconstante, cada lugar resolvesse dar à luz, uma vez que fosse, a um ser cuja essência genética estivesse programada para contar ao mundo como era o lugar em que nasceu. E, desse modo, a literatura produzida por esses homens não apenas descreveria seu lugar, mas seria semelhante a ele, teria um ritmo similar, uma expressão análoga, um estilo idêntico. E, mais que isso, talvez os homens a quem o fado exigia que cantassem sua terra fossem, eles próprios, parecidos com a terra que cantavam. Se assim fosse, seria mais fácil compreender por que a literatura de Machado de Assis era rebuscada e petulante como o Rio de Janeiro, por que a prosa de Jorge Amado era sensual e debochada como a Bahia, por que a escrita de Graciliano era seca e dura como o sertão. E, se cada lugar cria sua literatura, os afluentes, as matas, os cerrados, as cidades, os povoados, os arraiais e o homem do grande vale do Rio São Francisco criaram Osório Alves de Castro e sua prosa barranqueira, entrecortada como o próprio rio, úmida como as terras ribeirinhas e, por vezes, afásica, pois assim é o homem a quem retrata.

Extasiado com a prosa do inaudito escritor nascido na margem esquerda do Rio Corrente, fui em busca de sua história nas enciclopédias desta e de outras terras. Qual não foi meu espanto: não havia verbete autônomo, nem verbete indicativo, nem parágrafo dos verbetes indicados, nem uma linha sequer; sequer uma linha. Abespinhado, deixei o peso das enciclopédias, vaticinando açodadamente sua incapacidade de registrar a aldeia global e, pressagiando sua obsolescência, conectei-me a Internet, a enciclopédia do século XXI, onde nada esta ausente, ainda que a presença, não raro, venha recheada de incorreções. E, pasmem os leitores, nenhuma biografia, nenhum estudo acadêmico, nenhuma tese, nada assomou a pantalha eletrônica a não ser três ou quatro menções vinculadas a outros temas. E, no entanto, Osório Alves de Castro deveria estar em todas as enciclopédias, em todos os sites de literatura, ombreando-se a Guimarães Rosa na galeria dos grandes escritores brasileiros. Assim o desejaria o próprio Rosa.

Prosa para isso tinha de sobra o escritor nascido na bucólica Santa Maria da Vitória, em pleno Além São. Francisco. Porto Calendário, seu primeiro livro, lhe trouxe o aceite da critica e lhe valeu o Prêmio Jaboti de Literatura, em 1961. Daí desmembraram-se duas outras obras primas, Maria Fecha a Porta Prau o Boi Não te Pegar e Baiano Tiête, formando a trilogia da integração nacional. Apenas isso já lhe valeria um verbete em negrito.

“No ano que vem, caminho de S.Paulo me tem”, essa era pichação que manchava os muros de Santa Maria da Vitória, de Correntina, de Barreiras, cidades do Vale do Rio S.Francisco, e seus autores, jovens que recém completavam 18 anos, logo estariam margeando o Tiête em busca da redenção econômica. Osório Alves de Castro cantou o fado desses jovens e deu vida ao povo ribeirinho, especialmente aquele que não tinha força ou desejo de deixar seu vale querido. E, apesar disso, as enciclopédias lhe regalaram o olvido e até seu povo, aquele que habita os cerrados da Bahia, parece não lhe prestar a devida atenção. Hamlet estava errado: não há esperança de que a memória de um grande homem possa sobreviver-lhe sequer por meio ano.

Vivo estivesse, Osório Alves de Castro tripudiaria de minhas preocupações, afinal, não estava ele redimido pelas palavras de Guimarães Rosa: “Oh, o homem do São Francisco! Pudesse, eu ia lá, em Marília, conversar com ele, três noites e três dias, seguidos, sem pausa nem pio, sem fio nem pavio. Foi para mim uma rajada, um desembesto, um desadoro, um desabalo. Não tenho palavras. Foi um filme doido, vero, cinerama, passando diante de mim, de minha velhice-infância”. Não estava ele redimido pelas teses e estudos que, quando em vez, os jovens das universidades brasileiras entabulavam sobre sua obra. E, além disso, de que valem as enciclopédias frente a arte que teima em brotar das entranhas do homem.

E que homem! Que escritor! Não exprobre, condestável leitor, as exclamações que aí estão apenas para corroborar o espanto que assomou a pena de Rosa quando ele leu a carta, “a espantosa, a estouradora carta, mensagem dos cem mil cavalheiros“: a carta de Osório Alves de Castro, publicada na Revista Diálogo em 1957. Não, não era uma carta, era já um romance, condensado em poucas páginas, mas caudaloso, cheio de corredeiras e quedas d’águas. As águas do Velho Chico molhavam aquelas páginas, o homem do vale navegava naquelas palavras, os coronéis e os atravessadores, exploradores do ribeirinho, mergulhavam naqueles parágrafos barrentos, tudo já estava ali e iria desaguar no mar de Porto Calendário.

Que homem! Que escritor! Alfaiate, nunca renegou seu oficio, mas se de dia alinhavava os tecidos na sua Alfaiataria Rex de noite dava forma as palavras. E que forma! “Antigamente as noticias chegando era como um tempero insosso ganhava travo e a gente comprazia divera... Hoje? ... Que Deus tenha pena de nós. Tudo chega de supetão, arrasa e fica nas angústias como um arco-íris. Sumindo detardinha“.

Que homem! Ele próprio um personagem. De inicio, clarinetista na Orquestra Filarmônica Seis de Outubro, depois construtor de cenários e encenador de peças até que, de repente, viu-se comerciante transportando sal, rapadura e cachaça nas barcaças do São.Francisco. Em 1923, pensou enganar os muros da sua cidade, e foi para o Rio de Janeiro. Lá estudou latim, literatura e política e foi iniciado nas artes da alfaiataria. Mas não se foge do fadário impresso nos muros da inevitabilidade e lá se foi nosso homem morar em S.Paulo, em Marília, onde logo haveria um ponto de encontro para os intelectuais e para os amantes da literatura: a alfaiataria Rex, onde o militante comunista fazia do Capital o remo que o levaria ao porto do socialismo. A ditadura, tão pródiga em espancar os remeiros do futuro, o prenderia antes mesmo de saber-se ditadura, mas das grades ele podia ver a aurora cor de barro, barro que dava cor ao São Francisco...

Osório Alves de Castro, cerzindo palavras na sua alfaiataria, foi ele mesmo um personagem, tão bravo e insólito quanto Pedro Voluntário-da-Pátria, que se preocupava com o estio que sempre vem no fim-de-era: “Desde o Cariri até os cerrados da Bahia, entrando por Minas Gerias, não se vê uma folha verde”. Tão inaudito quanto Doquinha Peste-Bubônica, que ganhou o apelido por ter a língua venenosa como a peste, tão triste quanto o remeiro Salu que a zinga arrebentou os peitos e morreu botando sangue pela boca, incapaz de vencer a água do Quebra Botão. A zinga era vara que lutava contra a correnteza que de tão forte tinha a alcunha de Quebra Botão.

Porto Calendário é rio caudaloso formado de afluentes personagens e nem Macondo os teria gerado com tanta originalidade. Que dizer de Sussu Flores, Shahriar do cerrado, que mandava matar os amantes após dormir com eles, com o consentimento complacente do marido, Coronel Chico Fulô. Ou de Jove de Correntina com seus óculos comprados na Bahia que o fazia ver todas as mulheres nuas, em pelo, e que um dia os escangalhou nos olhos, ao mirar a própria mãe na procissão do Senhor Morto.

A pena do alfaiate era mais destra que a tesoura e a natureza e o tempo se faziam personagens. O Tamarindeiro, que servia de elo entre os que povoam as páginas de Porto Calendário, é tão protagonista quanto o tempo, retratado no Século que assustava os viventes das cidades à beira do Rio. “Um tal século, que vem trazendo na mão esquerda a espada de Moreira César e na direita um punhado de sementes encharcadas de sangue”.

Que escritor! Que romance! Porto Calendário, o romance da saga são-franciscana, é uma barcaça que reúne os remeiros, os pescadores, as prostitutas, as cassandras, os coronéis e todo o povo do Vale e os faz navegar no rio da literatura, ao sabor de ondas dialetais, das correntezas de palavras, dos desvios arcaicos, tudo isso tendo ao fundo a marca d”água do Rio S,.Francisco.

Acho que foi no inicio dos tempos que a Natureza resolveu criar uma planta capaz de prevenir-se da seca que as vezes assolava as terras do cerrado e das enchentes que inundavam as plantações carregando as sementes e o porvir. E assim as flores e folhas dessa planta da família das sensitivas se fecham imediatamente quando tocadas pelos homens, pelas águas ou pelos ventos. Engenhosa a Natureza e os homens que lhe deram por nome Maria Fecha a Porta Prau o Boi Não te Pegar. Mais engenhoso ainda Osório Alves de Castro que fez da planta título do seu segundo livro, um livro poesia, cheio de Marias que se fecham quando tocadas. Elegia ao Velho Chico, o romance corre como o rio, caudaloso e forte: “Veja, Maria!... É o nosso São Francisco. Vindo de longe, correndo do Sul para o Norte, é um abraço na imensidão, unindo as terras e as gentes do Brasil.“ Forma-se, então, o segundo elo da trilogia iniciada com Porto Calendário e que se encerrará com Bahiano Tietê, romance da transformação, que mostra a dor, o sofrimento e a adaptação do povo ribeirinho que agora habita as terras do café. E mais uma vez o Rio São Francisco sela a integração nacional e faz do homem do cerrado um Baiano Tiête.

Osório Alves de Castro morreu em 1978 antes de ver BaianoTietê no prelo. O livro, que só foi publicado em 1990 pela Empresa Gráfica da Bahia, traz um prólogo de Jehová de Carvalho que, indignado, brada contra o mutismo que tomou conta da imprensa nacional quando da morte do escritor: nem um obituário, uma resenha sequer, sequer uma retrospectiva sobre a obra do autor que encantou Guimarães Rosa. Jehová fulminava, como uma cassandra que pressagiava o esquecimento de si mesmo: “Osório Alves de Castro tinha um defeito grave: era escritor baiano e pobre”.

Que seja. Que os obituários não registrem sua morte, que as enciclopédias queiram negar-lhe existência, que a Internet não tenha sites capazes de abarcar sua obra. Não importa. A prosa de Osório Alves de Castro é tronco milenar, é flor do cerrado, é planta que se fecha para quem não sabe tocá-la, é cedro que faz o oco das canoas, é rio perene, ancho, barrento e alongado, e sobreviverá navegando na alma de quem ama a literatura e o Rio São Francisco. É prosa única que “vem do Porto das Calendas onde tudo-tudo se dará“.

Por Armando Avena é escritor, jornalista e economista. Membro da Academia de Letras da Bahia.

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

II Encontro de Reisado reúne grupos e ternos de reis de cidades do Território da Bacia do Rio Corrente e do norte de Minas Gerais

Reis da Providência Divina de São Félix do Coribe 
O reisado é celebrado com encontro festivo no município de São Félix do Coribe contando com a presença de grupos e ternos de reis do Território da Bacia do Rio Corrente e do norte de Minas Gerais.
Reisado Sá Ana de Santa Maria da Vitória - Bahia
O reisado é uma manifestação da cultura popular presente em todos os municípios do Território da Bacia do Rio Corrente. Há registros em áreas urbanas e rurais, numa mesclagem de ritmos, danças e coreografias, destacando-se a singularidade entre os diversos grupos existentes. Essa manifestação de origem portuguesa, herança do Brasil colonial, ao chegar nessa região ganhou aspectos que reforçaram o regionalismo, desde instrumentos até as vestimentas. Cada um ao seu modo mantem a tradição e proporciona às novas gerações a possibilidade de apreciar uma manifestação secular, além de reafirmar respeito e responsabilidade em valorizar esse potencial cultural que se perpetua há anos.
Reis da União de São Félix do Coribe
O último dia 03 de janeiro foi marcado por um encontro festivo na Praça do Forro em São Félix do Coribe, onde população e visitantes, mais de 3 mil pessoas, puderam prestigiar a apresentação de diversos grupos de reis.
Terno de Reis dos Temerosos - Minas Gerais
O encontro organizado pela Secretária de Educação e Cultura de São Félix do Coribe através da Diretoria de Cultura do Município contou com apresentações dos seguintes grupos: Reis da Cabeceira Grande (Comunidade de Cabeceira Grande de Correntina), Reis da Providência Divina (São Félix do Coribe), Reis da União (Comunidades de Águas Claras e Vera Cruz de São Félix do Coribe), Reis de Porto Novo (Comunidade de Porto Novo de São Félix do Coribe), Reis de Sá Ana (Santa Maria da Vitoria), Reis de Santo Reis (Comunidades de Olho D’Água e Alagoinha de São Félix do Coribe), Reis de São Francisco (São Félix do Coribe), Reis de Zé de Belina (Jaborandi), Reis Guarany (Santa Maria da Vitória), Reis Os Filhos de Júlia (Comunidade do Tatu em Correntina) e também com o Terno de Reis dos Figueiredos, que existe desde 1888, Terno de Reis dos Temerosos e a Dança de Gonçalo sendo ambos do município de Januária – Minas Gerais.
Celo Costa
“É relativamente simples realizar um evento desse porte e pensar que numa ação dessa envergadura conseguimos dar ao reisado uma posição de destaque. É o destaque que o reisado merece pela sua importância na construção da nossa identidade cultural”, avalia Chico Mallero, folião e coordenador do evento.
Cevisa Harmonia
Ao final, o publico apreciou o show de Celo Costa, referência cultural e filho da região, e também a apresentação do músico Cevisa Harmonia. Ambos fecharam o evento com maestria demonstrando o valor potencial da cultura autenticamente nordestina.
Reis de São Francisco
Por Culturas Corrente